Vale a pena diversificar via COE (Certificado de Operações Estruturadas)?
- Renda fixa
- 16 MAR 2022
- investo!
TL;DR: não!
Considerando o rol de instrumentos questionáveis disponíveis para o investidor, um COE típico, comumente oferecido por bancos e corretoras, lidera com larga vantagem o ranking de pior alternativa possível, atingindo um nível de dilapidação de patrimônio em longo prazo que desafia os limites da sardinhice. A questão é bem simples: quem, em sã consciência, contrataria um investimento com enorme risco, mas com probabilidade de retorno próxima a da poupança ou mesmo nulo? Indagando dessa forma objetiva, a resposta parece bem óbvia: ninguém!
Entretanto, reformulando a imagem desse produto por meio do “filtro gourmetizador de investimentos”, ou seja, fazendo uso de termos em inglês e acrônimos da moda como “ESG” (Environmental, Social and Corporate Governance), “Big Techs” e “Gaming Industry”, além de apelo maciço a grandes empresas multinacionais de difícil acesso ao investidor médio como Nintendo, Heineken, Puma, Louis Vuitton, dentre outras, essa aplicação passa a ser oferecida de uma maneira bem diferente:
- “COE ESG: A segurança da renda fixa, com a valorização da renda variável”;
- “COE Big Techs: Invista na Amazon e no Facebook por R$ 1 mil, sem risco de prejuízo”;
- “COE Gaming Industry: apartir de R$ 5 mil, você investe na indústria bilionária de entretenimento digital composta por Nintendo, Bethesda e Activision com capital garantido”.
Sob essa nova roupagem, muito mais atrativo. E infinitamente mais sardinhesco.
A brutal realidade, convenientemente não informada nas sofisticadas lâminas informativas (espécie de manual de divulgação do investimento) desses contratos, é que a esmagadora maioria dos COEs a disposição de investidores de varejo tem retorno abaixo da chamada taxa livre de risco (portanto, pior que o rendimento dos títulos públicos; por definição, um investimento com risco maior que o soberano deve obrigatoriamente ter maior retorno exatamente para justificar seu aporte).
Em outras palavras, por que o investidor se arriscaria em investimento claramente atrelado à renda variável, mas com rentabilidade de renda fixa ou potencialmente nula e, ainda pior, do qual nem sequer pode se arrepender e resgatar no momento que achar mais conveniente antes do vencimento? Nesse caso não há nenhuma ginástica mental ou fachada de requinte que consiga responder essa questão. Os investidores de varejo não recebem a informação de que o COE pode render menos que o investimento com maior grau de segurança do mercado, tampouco têm as ferramentas necessárias para efetuar esse cálculo.
Dada essa triste constatação, do que consiste esse tipo de aplicação, afinal? O COE (Certificado de Operações Estruturadas) é, em suma, um aglutinador de diversos contratos. São “estruturados” porque consistem em “empacotar” vários investimentos e movimentações financeiras em um único produto, que são vendidos como uma coisa só. Esse instrumento é então apresentado pelas contrapartes (bancos, corretoras, escritórios autônomos, etc.) como uma alternativa viável para as pessoas que têm aversão a riscos, mas que desejam expandir seu capital por meio do mercado financeiro. De forma simples, ao investir em um COE, o investidor compra um mix com uma parte pequena de derivativos de um ativo ou um índice específico e o restante em renda fixa.
Esses índices podem ser:
- Ações e índices de ações;
- Commodities;
- Índices de inflação;
- Juros;
- Moedas;
- Ouro.
Assim, é possível ter exposição a moedas (como dólar, euro, etc.), índices (como o S&P 500, por exemplo) ou ações de empresas famosas que não são listadas localmente sem precisar comprar os ativos específicos. Quanto mais sedutor a parte da renda variável, melhor, porque é isso que a corretora vai alardear como diferencial no momento de vender o COE.
Pelo menos o capital é protegido, certo? Apesar dessa promessa vinculada aos COEs mais comercializados no mercado, não é exatamente o que ocorre. Se a premissa não se concretizar (a cotação da ação ou índice cair em vez de subir no período, por exemplo), o investidor recebe o valor inicial de volta, porém sem nenhum rendimento e nem correção pela inflação, o que por si só já é um prejuízo enorme, que tende a aumentar conforme a duração do contrato. Além disso, esses instrumentos costumam imobilizar o capital por um período mais longo, entre dois a até dez anos, e não tem liquidez, apesar de haver um mercado secundário. Não é raro existir grande penalidade a ser paga em caso de venda antecipada. Não há problemas em abrir mão de liquidez, desde que isso te garanta um retorno maior do que aquele oferecido por um investimento que te permite resgatar o dinheiro a qualquer momento, o que não acontece.
Por fim, como o COE é uma operação que arranja diversos investimentos, fica praticamente impossível saber o quanto as instituições financeiras estão cobrando de fato por esse serviço. Diferentemente de fundos, em que gestores são obrigados a dizer quanto cobram para administrar o dinheiro do cliente, no COE essa taxa é muito bem escondida na estruturação do produto. Não obstante, os agentes recebem grandes comissões a cada venda contabilizada. Normalmente, o COE tem uma taxa de montagem, que é o custo de comprar os derivativos. Dessa forma, tem um percentual de remuneração de toda a cadeia que, normalmente, gira em torno de 0,8% a 1% ao ano. Portanto, um COE de cinco anos de duração, renderia ao assessor 5% de comissão, taxa paga de uma vez só, no ato da aplicação.
Não se iluda: as operações são estruturadas de modo a garantir o lucro para as instituições financeiras, não para o investidor.